segunda-feira, 2 de junho de 2008

Desolação

Depois deste post e deste, a vida na machamba foi voltando à normalidade.
Num terreno de cerca de 2000 m2, composto por mais de uma dezena de machambas, machambeiras e sem-abrigo partilham o mesmo espaço com os corvos e as galinhas do Sr. António, em quase perfeita comunhão . . . não fôra o lixo.

Uma machambeira em particular despertou-me o interesse. Chegava de manhã cedo com um bebé de poucos meses, deitava-o no chão à sombra da única mandioqueira já árvore feita e ia machambar. De início fiquei apreensiva com a possibilidade de algum bicho africano fazer mal ao pobre rebento mas com o passar do tempo, habituei-me e fui acompanhando o desenvolvimento do bebé. Ouvi o primeiro palreio e observei-lhe as primeiras tentativas para levantar a cabeça, deitado de barriga para baixo . . .
Chegado o meio da manhã, chorava de fome ou de aborrecimento e a mãe, entrouxava-o nas costas, machambava mais um pouco e ia-se embora.

Também os sem-abrigo mantiveram as suas rotinas . . . e a compostura . . .

Hoje de manhã um barulho diferente levou-nos à varanda das traseiras, para descobrirmos um tractor a arrasar, sem apelo nem agravo, todo o verde, viçoso e por colher.
Nada se salvou (o Sr. António ainda conseguiu manter parte da sua machamba . . . por hoje) e por pouco não obrigavam o tractorista a varrer os sem-abrigo também (ele parou o tractor e aparentemente recusou-se a dirigir o tractor nessa direcção . . . se os querem expulsar, vão lá falar com eles). Penso que esse foi o único objectivo desta destruição gratuita. À falta de coragem para mandar embora os suspeitos dos assaltos que alegadamente tem acontecido nas nossas barbas, sem que disso tenhamos dado conta, arrasa-se com tudo.

Em poucas horas, os responsáveis pelo terreno, conseguiram destruir o que mais de uma dezena de famílias levou anos a criar para seu sustento.
As traseiras são hoje a imagem da desolação. O lixo, triturado e espalhado pelo campo nu, é agora a única coisa que cresce por ali.

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