Ah!... passear por Lisboa, sozinha, finalmente. Sem ter que estar constantemente a defender as vicissitudes duma cidade cosmopolita, com muitos senões (por isso fugi por dez anos) mas impossível de percorrer sem se lhe apreciar a beleza. Esquadrinhar todas as capelinhas que trazem sempre à memória qualquer coisa de aconchegante. Descer da Graça, passando pela Feira da Ladra, para a Baixa, a caminho de lado nenhum, sem horas no pulso ou na ideia. Num passo tranquilo... aquela pedra a chamar-me a biqueira do sapato... apesar de tudo convém alguma moderação.
Sentar-me nas escadas da capela de Santo António, por regra ocupadas por pedintes e agora desocupadas, exclusivamente para eu me sentar, respirar, cheirar o ar.
A estátua de Santo António, de costas viradas para mim, espicaça-me os devaneios e eu, discretamente, como quem saltita para outro poiso, vou sentar-me junto dele.
"Então?... Dizem que és casamenteiro?"... "Comigo não tens muita sorte, o rol já vai longo e não há maneira de acertar. Tenho uma sina que os escolhe a dedo, é só lixo."
Embaraço-me com olhares inquiridores que passam mas recobro a postura. Afinal quem é que estranha uma lisboeta, sozinha, em meditação na companhia de Santo António... turistas... este sorriu-me.
"Onde é que eu ia ?... Pois. É que apesar do meu coração sofrer de total falta de discernimento, o meu nível de exigência é elevado."... Chego-me um pouco mais, em estilo de confidência... "Não é que eu esteja a pedir, eu até estou muito bem sozinha, mas nunca se sabe... É melhor deixar a questão bem esclarecida".
"Se tivesse que acabar com esta tão bem-vinda e recente liberdade, só queria um homem bom... inteligente, com sentido de humor, generoso, que gostasse de crianças, bom pai e... se fosse bonito, era ouro sobre azul."... não me esqueci de nada... "Já agora, se estivesse bem provido para enfrentar esta vida de cão, também não era mau."... Discretamente, agradeço qualquer coisinha, levanto-me, sacudo as calças e continuo o meu passeio até ao Terreiro do Paço, a ver o rio e os cacilheiros que tantas vezes me trouxeram de volta.
O tempo de entrega pode demorar dois anos mas o nível de satisfação é elevado.
terça-feira, 18 de março de 2008
Efeito Santo António
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Agora aqui que ninguém nos ouve,
Lisboa
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